IDÉIA ROUBADA
O que é uma idéia? Será que ela pode ser roubada? E como se rouba uma idéia?
Essas perguntas passaram pela minha cabeça num dia que pesquisando na internet, me deparei com uma peça que partia exatamente de uma idéia que eu tinha tido há alguns anos atrás. Tratava-se de uma peça de teatro, com o nome de uma música popular brasileira, cantada por Dalva de Oliveira, chamada “O pequenino grão de areia”, transformada em enredo teatral.
No ano de 1998, fiz um curso de Técnico de Pintura Cenográfica, no Teatro Odílio Costa Filho na UERJ, onde tínhamos diversas matérias, e entre elas, uma chamada “Artes Cênicas”, ministrada pela professora Thereza Rocha. Essa matéria falava sobre o teatro propriamente dito, isto é, seu espaço físico e os profissionais envolvidos em um espetáculo, tais como diretores, atores, cenógrafos, pintores, maquinistas, carpinteiros entre outros.
A professora Thereza costumava pedir aos alunos, trabalhos escritos, sobre as áreas em que cada aluno pretendia futuramente trabalhar. Algumas vezes era dado um texto onde cada aluno, desenvolvia seu trabalho, como escolher a trilha sonora, iluminação e no nosso caso, descrever como seria pintado o cenário. Enfim, os trabalhos eram feitos de forma que estivéssemos preparados para criar ou desenvolver as idéias de outros profissionais, o que eu achava o máximo, pois assim estávamos sendo preparados para qualquer coisa que o mercado exigisse de nós futuros profissionais. Como encerramento das aulas nessa matéria, nos foi pedido para escrever um esquete, onde mais uma vez deveríamos descrever os nossos trabalhos, na área pretendida, no meu caso, pintura de cenário. Só que eu fiz muito mais que isso, desenvolvi toda a idéia de uma peça. Não era só um esquete, nem uma sinopse era a própria peça. Uma adaptação da música “Um pequenino grão de areia” cantada por Dalva de Oliveira. Uma estória que eu sempre contava para minhas filhas quando elas ainda eram muito pequenas e mais tarde para meus sobrinhos. A estória era sempre aumentada ou diminuída de acordo com as minhas necessidades, de passar algum fundo moral. A estória sempre falava de amizade, colaboração, respeito, amor, família e etc.
Naquela época, eu não me lembrava de quem era a música e nem quem cantava, mas para as crianças, isso não fazia a menor diferença. Eu aprendi a contar essas estórias com meu pai, que tinha o seu personagem, o “Capitão Lafite” um pirata que viajava os “sete mares” e sempre que aportava o seu navio “Albatroz” trazia as novidades desse mundo encantado. Ainda hoje lembro de algumas peripécias do Capitão Lafite, assim como meu sobrinho mais novo, sempre me pergunta: _Tia lembra quando você me contava a estória da estrelinha? É claro que sempre me lembro, ainda mais agora, que vi minha idéia sendo realizada exatamente como eu a havia concebido, sendo realizada por outra pessoa. O melhor... Ou pior é que a peça foi indicada para cinco categorias do prêmio Zilka Sallaberry; prêmios de Melhor Espetáculo, Melhor Direção, Melhor Texto, Melhor cenário e Melhor Iluminação. Ela parte exatamente da minha idéia acrescida de alguns personagens extras, que não foram criados por mim. Mas todos os que eu criei estão lá, e como se trata de uma adaptação, é lógico que não precisa ser igual.
A grande pergunta, que não sai da minha cabeça, é se esse trabalho foi entregue a outra pessoa experiente, no caso aqui, o escritor e roteirista João Falcão ou se simplesmente tivemos a mesma idéia. E como ele é uma pessoa do meio artístico, teve todas as facilidades para poder produzir.
A ficha técnica do espetáculo não faz nenhuma referência ao nome da professora ou seu marido (que também era diretor de teatro). Mas como já vi de tudo nesse meio, será que meu trabalho foi mostrado a alguém ou minha idéia foi comentada e a partir daí copiada. Será que tudo não passa de mera coincidência.
Em artes o que é uma idéia, e como ela pode ser roubada, e como se torna um plágio?
Todos nós podemos ter uma idéia parecida, e isso que dizer que alguém a roubou de outrem... E quando essa idéia é executada torna-se um roubo... E quando existem inúmeras semelhanças, ela passa a ser um plágio... Não sei, só sei que é muito frustrante, ver sua idéia guardada com tanto carinho, ser descoberta de forma. E agora, se eu resolver produzi-la, quem será o plagiador e quem será o plagiado. É lógico que o texto pode ser modificado, mas sempre será visto como se eu tivesse plagiado o João Falcão, fora que o nome não poderá ser usado, pois a canção já é de domínio público, mas provavelmente, o título da peça já está registrado, e eu teria que pagar os devidos direitos autorais.
Em resumo, por pura ignorância, literalmente, desconhecimento de como funciona esse mercado, e ingenuidade de achar que quando se tem uma idéia, devemos compartilhá-la com pessoas mais experientes...MARQUEI TOUCA!!!
Agora só me resta, morrer de inveja...rsrsrs... E ir assistir o espetáculo para conferir tudinho e criticar. Bem, para me consolar, tem o fato do João Falcão ser um ótimo escritor, o cenário ter ficado maravilhoso, bem melhor que o que eu tinha imaginado, o Sergio Marimba foi genial (meu seria todo pintado, e talvez um tanto medíocre, pois eu tinha que falar sobre pintura de cenário), a música que tanto ouvi meu pai cantar e que me traz boas lembranças, ser novamente divulgada e o mais importante, os valores que eu sempre procurei preservar e passar para minha família estarem sendo passados para a garotada. Nesses tempos de tanta quebra de valores, falta de educação e de ética e de tanta corrupção, acho que passar valores morais para a nova geração é só o que conta. E como minha idéia central era isso, acho que o espetáculo está valendo, afinal não entrei no espaço das artes, e as minhas idéias acabariam na gaveta.
PARABÉNS AO PEQUENO GRÃO DE AREIA E SUA TURMA!
No fundo, no fundo, bem lá no fundinho, a peça não era tão parecida assim...rsrsrs (essas uvas estavam verdes).
Ai...Gente... Acho que esse texto deveria ter outro título... Quem sabe, alguma coisa como “a inveja e suas mazelas...”...
Bem aí vai parte do meu trabalho, e que realmente, ficou muito a desejar, diante do outro.
O PEQUENINO GRÃO DE AREIA
Por Sandra Gomes
Cursos para Técnicos em Espetáculos de Diversões
Teatro Odylo Costa, filho –UERJ- 1998
CENÁRIO – No telão pintado um pôr do sol com as primeiras estrelas começando aparecer. O mar refletindo o sol avermelhado.
RIVA - Pintada a espuma do mar chegando na beira da praia.
TRAINEL – Pintado com pequenos morros de areia.
LUZ – Na linha do horizonte alaranjada e azul no céu intensificando a boca da noite.
1º ator – abaixado em frente a riva vestido como ESPUMINHA do mar, ficando confundido com o cenário.
2º ator – abaixado em frente ao trainel vestido como GRÃOZINHO DE AREIA que também se confunde com o cenário.
Um foco de luz azul na Espuminha, que começa a se levantar, ao som de ondas quebrando na praia. Outro foco no Grãozinho, que também começa a se levantar lentamente, e dançar com a Espuminha, ao som de “Copacabana princesinha do mar”.
Os dois juntos brincam e dançam por algum tempo, então a música pára.
A Espuminha olha para o céu e fala.
_ Grãozinho, olha o céu!
O Grãozinho pára de dançar, olha para o céu e diz:
_ É... Espuminha... A noite vai ser linda!
ESPUMINHA _ Grãozinho, você já viu como o céu se parece com o mar?
GRÃOZINHO _ Veja as nuvens se parecem tanto com você!
ESPUMINHA _ E as estrelas, como brilham... São lindas!
GRÃOZINHO _ Olha! Olha aquela ali! (apontando para o céu). Veja como brilha! Sabe Espuminha, eu gostaria tanto de viajar até o céu...(o Grãozinho se senta e fica olhando para o céu, admirando aquela estrelinha, tão brilhante e delicada).
ESPUMINHA _ Hei! Ficou maluco! Nem com mil vendavais, você chegaria lá! E ainda poderia ir parar no meio do deserto do Saara! (a Espuminha caminha em direção a platéia e fala para o público) _ Coitado do meu amigo Grãozinho, está apaixonado e logo por uma estrelinha! Preciso fazer alguma coisa antes que ele peça ajuda ao maluco do Vendaval. (e sai do palco)
As luzes vão diminuindo até a escuridão total.
Desce um fundo azul escuro (noite) e um foco de luz direcionado para um globo espelhado refletindo pequenas estrelas no fundo escuro. Entra uma luz azul clara, iluminando os atores fazendo uma noite clara e brilhante.
Em cima de um praticável um ator vestido de lua se espreguiça, começa a tocar a música “As pastorinhas”. Entra outro ator vestido de estrela e mais dois de nuvenzinhas, que cantam e dançam juntos com a estrelinha.
LUA – Ah! Fico tão cansada quando o sol se deita tarde, brilhar junto com ele não é nada fácil.
1ª NUVENZINHA _ Que nada! Você até gosta de estar do lado dele!
2ª NUVENZINHA _ É verdade, tanto que fica mais brilhante ainda, nestas noites!
ESTRELINHA _ Eu não; adoro brilhar e ficar olhando lá para baixo. (fala respondendo para a Lua).
LUA _ Lá para baixo?! E o quê existe de tão interessante lá baixo, para se ficar tanto tempo se apreciando? Só tem água, e um pouquinho de terra. (A Lua olha para o público e pergunta) _ Porque será que chamam a Terra de Terra, quase só tem água deveria se chamar de Planeta Água.
ESTRELINHA _ A praia! Ora! (fala com cara de alegria e excitação, responde à Lua).
LUA _ A praia?!
As duas nuvenzinhas, apoiando a Estrelinha.
1ª NUVENZINHA _ É mesmo! O mar se parece muito com o céu!
2ª NUVENZINHA _ Olhem, as espuminhas se parecem muito conosco, nuvenzinha.
1ªNUVENZINHA _ E os grãos de areia parecem pequenas estrelinhas.
ESTRELINHA _ Eu já tinha notado isso há muito tempo, e é por isso que eu fico olhando lá para baixo. (E apontando para baixo) _ Veja aquele Grãozinho bem ali, correndo com as Espuminhas, até parece uma Estrela Cadente quando corre junto com a D. Brisa.
LUA _ A D. Brisa é uma ótima professora de ginástica. (fala com um ar de quem sabe tudo).
1ªNUVENZINHA _ Quem será aquela que vem lá longe, subindo tão apressada?
2ª NUVENZINHA _ É a Espuminha!!! E parece cansada! (fala sorrindo)
LUA _ Tá vendo só! Não sou só eu que fico cansada de trabalhar junto com o sol!
ESTRELINHA _ Meninas! Meninas! Parem com essa bobagem e vamos saber das novidades lá de baixo!
LUA _ Espuminha o que te trouxe aqui com tanta pressa, para te deixar tão cansada? Sua mãe sabe que você anda pegando carona com o Vento?
ESPUMINHA _ É verdade, saí e não avisei a minha mãe, por isso não posso me demorar.
LUA _ Que perigo! Mesmo o Seu Vento sendo um grande amigo da sua família, não se pode sair sem avisar, e se acontece alguma coisa? O Seu Vento nem sempre dirige direito, às vezes ele dirige em alta velocidade. Bem, vamos ao assunto sem mais delongas. O que você veio fazer aqui?
AS DUAS NUVENZINHAS (em coro). _ Fala, fala logo, estamos mortas de curiosidades.
ESPUMINHA _ O meu grande amigo Grãozinho de areia está perdidamente apaixonado pela Estrelinha. E eu vim até aqui para fazer o papel de cupido.
1ªNUVENZINHA _ Que lindo! Que lindo! O amor é lindo!
2ª NUVENZINHA _ A Estrelinha também está apaixonada por ele!
ESTRELINHA _ É verdade? Ele está apaixonado por mim? Ele é uma gracinha... (fala com ar de encabulada e sonhadora).
ESPUMINHA _ É por isso que eu vim conversar com vocês. Ele está tão apaixonado que anda querendo pedir carona para aquele Vendaval arruaceiro, pois Seu Vento não tem forças para carregá-lo, e tentar subir até aqui. O máximo que o Grãozinho vai conseguir é ir parar no meio do deserto do Saara, e ficar perdido por lá.
ESTRELINHA _ Nossa que perigo, eu não gostaria de vê-lo, perdido no meio do deserto por minha causa.
1ª NUVENZINHA _ Já sei! Tive uma grande idéia!...
2ªNUVENZINHA _ Sua alcoviteira! (fala com ar de cumplicidade).
1ª NUVENZINHA _ Sou mesmo, mas você também é.
LUA _ Essas duas não tem jeito, mesmo.
ESTRELINHA – Fala! Fala logo! Qual a sua idéia?
1ª NUVENZINHA _ Se a Espuminha não estiver muito cansada, podemos nos juntar e chamar a chuva para dar uma carona à Estrelinha. E assim nós a levaremos até a praia.
LUA _ Ótima idéia. Assim o céu fica nublado, eu me recolho e vou dormir mais cedo. Desculpe Estrelinha, mas estou mesmo muito cansada, e logo, logo estarei crescente.
As duas nuvens se abraçam com a Estrelinha, dão a mão a Espuminha e sema correndo pelo céu.
LUA _ Ei! Meninas vejam lá o que vão aprontar, a Espuminha não pode se demorar aqui. Ela precisa voltar rápido para a praia, pois sua mãe já deve estar preocupada. (acenando para as amigas) Adeus! Boa Viagem!
Em seguida boceja para a platéia e fala: _ Vou aproveitar para me recolher mais cedo, pois amanhã começo a ficar cheia, e terei muito trabalho.
Apagam-se as luzes. Volta o cenário da praia. Luz amarela no horizonte e azul claro no céu, é o raiar do dia.
O Grãozinho está sentado na beira d’água, olhando para o céu.
Entra a Espuminha, para ao lado do Grãozinho, arquejando de cansada.
ESPUMINHA _ Grãozinho, tenho grandes novidades para você, estive ocupada a madrugada inteira.
GRÃOZINHO _ Fala... Estou ouvindo...
ESPUMINHA _ Nossa, para que tanto enfado, hoje será um lindo dia!
GRÃOZINHO_ É por isso mesmo, pois com tanto sol não poderei enxergar a minha amada até a noite. Eu fico muito triste, só de pensar nisso.
ESPUMINHA _ Não fique triste, meu amigo, seus problemas acabaram.
GRÃOZINHO _ Como acabaram?! Você sabe que meu amor é impossível.
ESPUMINHA _ Pode até ser difícil, mas nada é impossível, quando se têm amigos para ajudar. (diz a Espuminha com um sorriso maroto, e ao mesmo tempo fazendo um ar de mistério). TCHAN,TCHAN,TCHAM!
Entram em cena as Nuvenzinhas trazendo pela mão a Estrelinha.
O Grãozinho se levanta e abraça a Estrelinha.
GRÃOZINHO_ Meu amor como você é linda! E o seu brilho, ilumina até o meu coração! Mas como conseguiu chegar até aqui?
ESTRELINHA _ Com a ajuda das minhas amigas, Nuvenzinhas (fala apontando para elas)
2ªNUVENZINHA _ Não podemos esquecer que a ajuda maior foi da D. Brisa que pediu ao Seu Vento para nos dar uma carona.
GRÃOZINHO _ Muito obrigado minhas amigas, agora sou o grão mais feliz de todas as praias e de todo o fundo do mar.(todos se abraçam)
A 1ª Estrelinha se vira a platéia, e fala com o público.
1ª ESTRELINHA _ E assim eles foram felizes para sempre.
Bem meus amiguinhos, essa foi a estória que eu ouvi de como apareceu a Estrela do Mar.
Neste momento, entram todos os atores no palco e catam a música ”Pequenino Grão de Areia”.
FECHA A CORTINA